Robson Almeida Girardon
Carla e
Henrique eram dois apaixonados. Daqueles que andam com a foto um do outro
na carteira e fazem juras de amor em público. Poucas vezes eram
vistos separados. Se ele ia visitar os amigos, ela estava junto. Se ela
fosse escolher uma blusa nova, lá estava ele pra ajudar na
escolha.
Eles
compartilhavam das mesmas coisas, comidas,
ambientes e companhias. Até mesmo na paixão por piano
combinavam. Eram frequentadores fiéis de exposições e feiras sobre
música. Carla e Henrique trabalharam por dois anos e compraram juntos
um piano feito sob encomenda. Era um modelo vertical único, com
detalhes pensados especialmente para uso do casal.
No inverno, o
programa favorito era ficar em casa ensaiando duetos para o
Natal. Também era a época ideal para
ouvir as coletâneas compradas na última viagem que fizeram a Montevidéu. Visitavam
o Uruguai pelo menos uma vez ao ano, pois foi lá que
um dia eles se conheceram.
Ele levou fé nos olhos azuis da moça e correspondeu.
Na época,
ele tinha 18 anos e fazia sua primeira viagem
internacional. Ela com 21 anos já
era pianista profissional e viajava ao país vizinho com
mais frequência. Era uma noite fria e a sessão
musical estava completamente cheia. Antes mesmo de começar
a apresentação, Carla já botou o olho em Henrique. Ele levou fé nos
olhos azuis da moça e correspondeu. Em seguida tiveram uma longa
conversa, onde pareciam amigos de longa data. Após os primeiros
diálogos, sobrevieram sorrisos e abraços. O restante você imagina.
Já se
foram alguns anos e, como acontece com a maioria das pessoas, não
perceberam o tempo passar. Por qualquer inconstância da vida, se separaram. Pela
primeira vez, depois de muito tempo dividindo
a mesma rotina, cada um vai pro seu canto. Fica claro para
ambos que é preciso reaprender tudo de novo. Atos simples do
cotidiano agora são vividos de forma diferente. E a paixão pelo piano? Essa parece
que se encerrou junto com o relacionamento. Daí em diante, é preciso que cada
um reaprenda a cuidar de si próprio. Eles seguem em frente, cada um do seu
jeito, por caminhos diferentes.
Aquele piano que
compraram e mostravam a todos na sala de estar, já é parte do passado. Para
Carla e Henrique, o piano estava relacionado a tudo que viveram juntos.
Decidiram doar para uma igreja. Lá estará para sempre materializando os anos
dourados que tiveram. Agora, eles precisam viver o presente, construir o futuro,
encontrar novos caminhos, novos lugares, novas pessoas e hábitos diferentes de
ser feliz.
Talvez por isso hoje em dia tanta gente queira refazer o que já foi feito.
Não é fácil pra ninguém
recomeçar. A arte de deixar as mágoas de lado, sacudir a poeira e seguir em
frente é algo que não se aprende em cursinho. “Somos eternos prisioneiros do
tempo”. Talvez por isso hoje em dia tanta gente queira refazer o que já foi
feito. Retomar uma relação antiga, por exemplo, é algo que assusta. Os tempos
são outros. As coisas mudam e as pessoas também.
Carla e
Henrique guardam na memória tudo o que se passou. Agora seguem para uma nova
etapa de suas vidas. Dificilmente viverão novas histórias juntos. Mas ainda
estão aqui. Em breve encontraram outro hobby, um novo instrumento musical para
ocupar o tempo e uma outra paixão. E se a saudade insistir em procurar pelos
dois, eles sabem exatamente “onde se reencontrar”.
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