quarta-feira, 22 de julho de 2015

Um lugar para se reencontrar

Robson Almeida Girardon
Carla e Henrique eram dois apaixonados. Daqueles que andam com a foto um do outro na carteira e fazem juras de amor em público. Poucas vezes eram vistos separados. Se ele ia visitar os amigos, ela estava junto. Se ela fosse escolher uma blusa nova, lá estava ele pra ajudar na escolha.
Eles compartilhavam das mesmas coisas, comidas, ambientes e companhias. Até mesmo na paixão por piano combinavam. Eram frequentadores fiéis de exposições e feiras sobre música. Carla e Henrique trabalharam por dois anos e compraram juntos um piano feito sob encomenda. Era um modelo vertical único, com detalhes pensados especialmente para uso do casal.
No inverno, o programa favorito era ficar em casa ensaiando duetos para o Natal. Também era a época ideal para ouvir as coletâneas compradas na última viagem que fizeram a Montevidéu. Visitavam o Uruguai pelo menos uma vez ao ano, pois foi lá que um dia eles se conheceram.
Ele levou fé nos olhos azuis da moça e correspondeu.
Na época, ele tinha 18 anos e fazia sua primeira viagem internacional. Ela com 21 anos já era pianista profissional e viajava ao país vizinho com mais frequência. Era uma noite fria e a sessão musical estava completamente cheia. Antes mesmo de começar a apresentação, Carla já botou o olho em Henrique. Ele levou fé nos olhos azuis da moça e correspondeu. Em seguida tiveram uma longa conversa, onde pareciam amigos de longa data. Após os primeiros diálogos, sobrevieram sorrisos e abraços. O restante você imagina.
Já se foram alguns anos e, como acontece com a maioria das pessoas, não perceberam o tempo passar. Por qualquer inconstância da vida, se separaram. Pela primeira vez, depois de muito tempo dividindo a mesma rotina, cada um vai pro seu canto. Fica claro para ambos que é preciso reaprender tudo de novo. Atos simples do cotidiano agora são vividos de forma diferente. E a paixão pelo piano? Essa parece que se encerrou junto com o relacionamento. Daí em diante, é preciso que cada um reaprenda a cuidar de si próprio. Eles seguem em frente, cada um do seu jeito, por caminhos diferentes.
Aquele piano que compraram e mostravam a todos na sala de estar, já é parte do passado. Para Carla e Henrique, o piano estava relacionado a tudo que viveram juntos. Decidiram doar para uma igreja. Lá estará para sempre materializando os anos dourados que tiveram. Agora, eles precisam viver o presente, construir o futuro, encontrar novos caminhos, novos lugares, novas pessoas e hábitos diferentes de ser feliz.
Talvez por isso hoje em dia tanta gente queira refazer o que já foi feito.
Não é fácil pra ninguém recomeçar. A arte de deixar as mágoas de lado, sacudir a poeira e seguir em frente é algo que não se aprende em cursinho. “Somos eternos prisioneiros do tempo”. Talvez por isso hoje em dia tanta gente queira refazer o que já foi feito. Retomar uma relação antiga, por exemplo, é algo que assusta. Os tempos são outros. As coisas mudam e as pessoas também.

Carla e Henrique guardam na memória tudo o que se passou. Agora seguem para uma nova etapa de suas vidas. Dificilmente viverão novas histórias juntos. Mas ainda estão aqui. Em breve encontraram outro hobby, um novo instrumento musical para ocupar o tempo e uma outra paixão. E se a saudade insistir em procurar pelos dois, eles sabem exatamente “onde se reencontrar”.

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